Micos invadem apartamentos e furtam comida em Copacabana, na Zona Sul do Rio
A rotina do edifício Montes Claros, em Copacabana, mudou radicalmente no último mês. Grades foram instaladas em varandas e janelas. As áreas comuns do prédio receberam três novas câmeras de segurança. E os moradores passaram a evitar deixar a porta encostada ao pôr o lixo para fora.
Tudo isso por causa da arruaça provocada por um bando que vem furtando comida e pequenos objetos dos apartamentos. Mas não são assaltantes comuns: eles são peludos, extremamente ágeis e medem entre 20 e 30 centímetros. São micos.
— Outro dia houve uma confusão no corredor. Ouvi pessoas gritando: "Pega, pega!". Quando abri a porta e vi aquele corre-corre, achei que era um assalto. Na verdade eram os micos, que tinham conseguido chegar ao 11º andar — conta o jornalista Silvio Barsetti.
O problema ficou tão sério que o síndico convocou uma assembleia geral extraordinária em caráter de emergência, realizada no último dia 20. Na pauta de discussões, um único item: "Deliberação com relação à invasão de micos no condomínio". A ata da reunião registra que foi determinada a multa de um salário mínimo como punição para moradores que forem flagrados alimentando os animais. Também fez-se o alerta de que caso algum morador tente envenenar os micos, o condomínio poderá ser multado pelo Ibama.
— Sou síndico aqui há 16 anos e nunca vi isso O prédio está infestado. Os micos sujam as dependências, urinam e defecam nas cozinhas. Uma moradora vive com o pai, de 94 anos, e é obrigada a deixar tudo fechado porque os animais já urinaram na casa dela — conta Sérgio Vieira, de 85 anos, que acredita na hipótese de os animais terem se aproximado em busca de alimentos: — Tem pessoas que acham os animais bonitinhos e dão comida a eles. Os micos se acostumaram com essa docilidade e passaram a explorar outras áreas do prédio.
Um dos apartamentos invadidos foi o de Daniel Fontes, de 32 anos. Por ser apresentador de eventos esportivos, ele faz muitas viagens a trabalho, mas sempre toma o cuidade de deixar a unidade completamente fechada. Na ausência do morador, entretanto, os animais encontraram um jeito de entrar.
— Três deles subiram pela fiação e entraram pela tubulação de gás. Precisei tirar o cano, que ficou todo deformado, para colocar uma grade no lugar — diz Daniel, que apela: — As autoridades têm que tomar uma atitude, porque esses animais transmitem doenças. É um atentado contra a saúde pública. Isso aqui virou o planeta dos macacos.
O habitat dos animais é uma área de mata fechada localizada numa zona militar, aos fundos do condomínio. Na tentativa de resolver a situação, o síndico, Sérgio, entrou em contato com o Ibama e o Corpo de Bombeiros, mas se deparou com um jogo de empurra-empurra.
— O Ibama disse que caberia ao Corpo de Bombeiros resolver a situação. Já os bombeiros disseram que se fosse para capturar dois ou três micos eles viriam, mas que uma infestação de micos eles não podiam resolver.
Enquanto nenhuma solução é encontrada para evitar a invasão dos bichos, os moradores inventam a cada dia novas estratégias para espantar os arruaceiros.
— Antes a gente tinha medo de ladrão. Agora, é de mico. Não se pode ter sossego no Rio — diz, em tom de brincadeira, Barsetti.
Em nota, o Ibama informou que “retirar a família de seis saguis que está entrando nos apartamentos de um prédio em Copacabana não é função do Ibama. Se os animais estiverem ameaçando de fato a segurança das pessoas, o síndico deve acionar os bombeiros ou o órgão ambiental estadual (o INEA), que, se precisarem de apoio técnico, acionarão o Ibama para auxiliar nesta tarefa”.
Leia a nota do Ibama na íntegra:
“Os saguis de tufos-brancos (Callithrix jacchus) e de tufos-pretos (Callithrix penicillata), ambos conhecidos como micos-estrela, vieram das regiões Nordeste e Centro-Oeste. Chegaram por aqui pelas mãos dos traficantes de fauna silvestre para serem vendidos como animais de estimação em feiras livres e lojas clandestinas, mas acabaram sendo soltos na cidade.
Hoje se espalharam pelo Rio de Janeiro e por outros estados do Sudeste e do Sul do país, onde ameaçam a sobrevivência de diversas espécies de animais nativos da Mata Atlântica.
Retirar a família de seis saguis que está entrando nos apartamentos de um prédio em Copacabana não é função do Ibama. Se os animais estiverem ameaçando de fato a segurança das pessoas, o síndico deve acionar os bombeiros ou o órgão ambiental estadual (o INEA), que, se precisarem de apoio técnico, acionarão o Ibama para auxiliar nesta tarefa.
De todo modo, a retirada dos animais só ocorre em último caso. Eles estão se aproximando do prédio porque os moradores estão oferecendo comida ou deixando alimentos desprotegidos. Ou seja, capturar esse grupo, mas não mudar o comportamento dos moradores, não vai solucionar o problema. Provavelmente, em pouco tempo, outros micos irão ocupar o mesmo local.
Não se deve nunca alimentar animais silvestres sob o risco de se interferir para pior no equilíbrio da natureza”.