Lei mais rígida que permite penhora de imóvel de devedores em três dias aumenta procura por acordo para quitar débito. Inadimplência no setor cai de 20% para 12%
Há pouco mais de um mês da vigência da nova lei que fecha o cerco a condôminos inadimplentes, o número de moradores com cotas em atraso caiu de 20% para 12% no Rio. Segundo o Instituto Pró-Síndico, o medo que muitas pessoas tiveram de perder o seu imóvel, ou outro bem que agora pode ser penhorado em até três dias, levou a uma corrida por negociações do pagamento de dívida fora do âmbito da Justiça.
Em 18 de março começou a valer o novo Código de Processo Civil (CPC) que acelera as ações de cobrança de moradores que não pagam a cota condominial. A mudança do código instituiu a taxa como título executivo extrajudicial.
Na prática, significa dizer que basta o credor entrar na Justiça com processo de execução, apresentando boleto e ata da assembleia com o valor da cota para cobrar o débito do inadimplente. Antes, esse tipo de cobrança era feita em ação ordinária, demorando em média de cinco a oito anos para a decisão final do juiz.
A lei mais dura acabou facilitando o trabalho de síndicos de mais dos cerca de 20 mil condomínios no estado. E, por consequência, se tornou uma ‘pedra no sapato’ dos inadimplentes, que estão se movimentando para parcelar seus débitos.
Segundo o diretor do Instituto Pró-Síndico do Rio, Carlos Sampaio, com esse movimento a taxa média de inadimplência, que antes da vigência da lei era de 20%, caiu para 12%. “A queda reflete a procura pela negociação”, declara Sampaio, que também é administrador de condomínio.
Ele destaca que o acordo extrajudicial é bem mais vantajoso: “Isso porque permite parcelamento maior da dívida”, observa, lembrando que, agora, o CPC permite o pagamento parcelado em apenas seis vezes. Síndico de um condomínio em Jacarepaguá, o aposentado Herly Brito, 60 anos, foi orientado pelo administrador a negociar com cinco moradores. A estratégia surtiu efeito com quatro deles.
“Conseguimos recuperar valores de alguns moradores. Mas há um que não nos responde e, enquanto isso, os outros têm que pagar a mais por quem não quer negociar”, queixa-se ele, que não exita em ter ‘mãos de ferro’. “Vamos ter que entrar com a ação de execução. A lei veio em boa hora”, diz.
Setor ainda avalia melhor estratégia
Ainda que administradores e síndicos comemorem a nova lei, especialistas do setor e em Direito Imobiliário ponderam que nem sempre a ação de execução é a melhor opção.
Vice-presidente do Secovi Rio e diretor da Apsa, Leonardo Schneider diz que o processo tradicional não deve ser descartado, ainda que seja demorado. Isso porque a execução limita-se à cobrança de apenas um período. “Neste caso, o valor é fixado e as próximas cotas a vencer não ingressam no processo. Isto pode custar mais para o condomínio. Já a ação tradicional de cobrança demora mais. O condomínio deve avaliar se o valor compensa com relação ao tempo”, observa Schneider.
O advogado Sérgio Sender, que atende a Lowndes Administradora, lembra ainda que para entrar com a execução é preciso ter o valor da cota firmado em assembleia. “Sem isso, não é possível”, pontua.
Vias administrativas devem se esgotar
Os condôminos que estão com dívidas e ainda não fizeram um acordo devem se antecipar. Esse é o alerta da advogada Vanessa Sanson, especialista em cobrança condominial pela Tudo Azul Condomínio. Segundo Vanessa, a nova lei não deixa brechas para a inadimplência. Se o credor entrar com ação, ainda que o devedor não seja encontrado, o porteiro, ou outro funcionário do prédio, pode receber a notificação judicial de citação do devedor.
“Essa é uma novidade no código”, afirma a especialista, explicando que, depois que o credor entra com o processo, o devedor é citado e tem que indicar bens para penhora ou quitar a dívida integralmente ou parcelada. “Mas se o devedor sumir, o porteiro pode ser citado e o prazo de três dias começa a correr. Com isso, o juiz pode determinar a penhora de qualquer bem indicado pelo credor na ação, mesmo sem resposta do inadimplente”, afirma.
Acordo extrajudicial ficou mais atrativo para devedor, segundo os advogados Vanessa e Carlos Calmon
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Outro ponto que a especialista destaca é a rigidez do acordo na Justiça. Para Vanessa, a negociação administrativa ficou mais atrativa. “Na Justiça ficou ruim, pois o acordo é limitado a pagamento de 30% na entrada e parcelamento em até seis vezes. Fora do processo, é possível oferecer mais parcelas”, observa.
Vanessa ressalta, porém, que não há como isentar o devedor de juros e multa. “Esse é um valor comum de todos moradores, que pagam a mais para cobrir o buraco de quem não está em dia com as contas”, diz ela.
O diretor do Pró-Síndico, Carlos Calmon, afirma que antes de entrar com a ação, a administradora notifica o devedor e espera 30 dias. Depois, o jurídico cumpre o mesmo trâmite. “Depois disso, se não houver resposta, deve-se ir à Justiça”, diz.