Porteiros são a ponte entre a rua e o isolamento na luta contra o coronavírus
A máscara de proteção já é parte do uniforme do paraibano José Aderson da Silva, de 50 anos, 32 deles dedicados à portaria de um prédio em Copacabana, na Zona Sul do Rio. O porteiro não se afasta de um borrifador com álcool, que serve tanto para higienizar suas mãos quanto para os embrulhos que entregadores deixam para os moradores do condomínio, na Avenida Nossa Senhora de Copacabana. Desde o início da pandemia, quem mora no local evita descer, enquanto quem entrega não pode mais subir.
O isolamento fez com que o porteiro se transformasse na principal ligação entre os moradores dos 110 apartamentos, distribuídos por dez andares, com o mundo externo. A estimativa do sindicato da categoria é de que existam mais de 120 mil profissionais em atividade na cidade. A rotina destes trabalhadores é o tema de hoje da série “Os Essenciais”.
— Minha rotina mudou, e a dos moradores também. A maioria não desce. Tem gente que não vejo há uns 20 dias. O medo faz com que a gente vire a ponte deles com o mundo externo — conta o morador do Morro da Cotia, próximo à Autoestrada Grajaú-Jacarepaguá.
Já no edifício em que Antônio Ferreira trabalha, todos os pacotes que chegam para os 22 apartamentos são higienizados por ele. O álcool é o principal artigo e arma para combater a doença.
— Tudo que chega fica na portaria. Não sobe mais nada, para evitar o contato dos entregadores com os moradores. A gente, agora, é a linha de frente — definiu o porteiro, de 55 anos.
No Edifício Garanhuns, em Laranjeiras, também na Zona Sul, José Carlos Alves, de 44 anos, comanda uma equipe de três porteiros. A principal mudança na rotina foi a adoção de uma escala de trabalho de 12h por 36h para que eles possam ficar mais tempo em casa, e com isso diminuir também o fluxo de pessoas no local. A prática vem sendo adotada por outros prédios com mais de um profissional de portaria.
— Como é um serviço essencial, infelizmente a gente não pode ficar em casa. Mas fazemos o revezamento trabalhando — explica o morador de Ramos, que é casado e pai de um filho de 3 anos.
‘Passaporte’ na mochila
Colega de José Carlos Alves no mesmo edifício em Laranjeiras, Maurício Alves da Silva, de 43 anos, não tira mais da mochila o contracheque e a carteira de trabalho. Os documentos são seu “passaporte” para entrar no trem, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, onde mora.
— Quando me perguntam na estação o que faço, digo que sou porteiro, mostro o comprovante profissional e me deixam passar — diz o porteiro, que, além do trem, pega dois ônibus para chegar ao trabalho, às 7h.
José Gilvan está morando com a família no prédio ontem trabalha, na BarraJosé Gilvan está morando com a família no prédio ontem trabalha, na Barra Foto: Luiza Moraes
Na Zona Oeste, o porteiro José Gilvan Pereira da Silva, de 57 anos, que mantém fechada há mais de um mês sua casa em Pedra de Guaratiba, está morando no prédio onde trabalha, no Jardim Oceânico, na Barra da Tijuca. Ele divide o espaço com a esposa Selma, de 50, empregada doméstica no mesmo edifício, e a filha Ana Carolina, de 24.
— Tudo passa por nossas mãos: as encomendas, a limpeza e até mesmo a segurança. Daí a importância da profissão — avalia o profissional.
De olho nos direitos
No início deste mês, o Sindicato dos Empregados em Edifícios e Condomínios do Município do Rio de Janeiro informou que a pandemia e a decretação de isolamento social interromperam as negociações relativas à Convenção Coletiva de 2020. Mas, a assinatura de um Termo Aditivo garante data-base, benefícios e normas a serem adotadas durante a crise.
Pelo termo, “a jornada de trabalho pode ser reduzida, assim como o salário, proporcionalmente. Porém, a redução deve ser de no máximo 25%. Mesmo assim, o salário não pode ficar menor do que o mínimo nacional”.
O termo garante ainda que esse trabalhador, cujo salário foi reduzido, não poderá ser demitido sem motivação, além de ter garantidos a manutenção de plano de saúde e auxílio alimentação, se já possuir esses benefícios. Apenas o vale-transporte pode ser suspenso nos dias em que ele não for ao trabalho. Férias também podem ser antecipadas, com prioridade para os que fazem parte do grupo de risco, diz o texto.