Consolidação dos grandes complexos de moradia e dos condomínios-clube possibilitou mudar a forma de convivência entre vizinhos e criar minicidades para dentro do portão
A convivência entre vizinhos nem sempre é fácil, especialmente dentro dos muros de um condomínio fechado. A construção de complexos cada vez maiores e mais completos, dotados de recursos e espaços coletivos, tornando-os praticamente um microcosmos quase autossuficientes, faz com que novas necessidades também surjam para aprimorar o convívio nestes ambientes.
É na busca por integrar os co-habitantes destes espaços que os síndicos e os próprios moradores acabam desenvolvendo atividades capazes de trazer mais harmonia para essas verdadeiras minicidades que se criam dentro de alguns dos condomínios.
Foi o que aconteceu no Parque Ecoville, um complexo com quatro torres já ocupadas e mais duas em construção, que conta hoje com 1300 moradores em seus 496 apartamentos. Síndico há nove meses, o jornalista Luiz Antonio Bartelli percebeu antes mesmo de assumir a gestão que era preciso incentivar os colegas curitibanos, caso quisesse que seu lugar de moradia tivesse um clima que ultrapassasse o bom dia no elevador.
“As pessoas acabam não interagindo se você não cria algo para valorizar o espaço dela, então para ajudar na convivência, fazer as pessoas se conhecerem, terem mais amizade, é preciso fazer algo”.
Na opinião dele, ter uma estrutura que estimula a convivência coletiva faz toda a diferença para que ações comecem a acontecer, mas ela precisa ser usada. “A gente tem salas que muitas vezes ficam paradas e as pessoas não vêm nem conhecer, e quando você incentiva isso, ela se valoriza, as pessoas ajudam a cuidar, vão fazendo grupos, melhora a tolerância entre os vizinhos”.
A primeira iniciativa dele neste sentido veio antes mesmo do título de síndico. Entusiasta do universo dos filmes, ele quis aproveitar o fato de que seu condomínio tem uma sala de cinema com capacidade para 90 pessoas e começou a organizar semanalmente uma sessão com entrada gratuita para os vizinhos.
“O condomínio oferece um auditório com projetor e boa estrutura de som, então a gente transmite lançamentos de programações de streaming. Temos agora todos os domingos à noite uma sessão que reúne entre 20 e 30 pessoas e já estamos tão acostumados que, quando não tem, eu até estranho”.
A proposta inspirou ainda outras iniciativas que variam entre encontros de moradores, que se organizam em ações que vão desde corriqueiros churrascos coletivos de domingo até festas temáticas. “Já tivemos Halloween, baile de Carnaval, Festa Junina. Neste ano, a gente pensa em fazer uma festa de fim de ano para comemorar junto o Reveillon”, conta.
Muitas destas iniciativas acabaram partindo dos próprios moradores, que passaram a contribuir com ideias e sugestões. Foi assim que começou a ser trazida para o condomínio uma feira de vegetais que se expandiu e agora já se tornou em um evento parecido com as feiras de rua de Curitiba, com direito até mesmo a pastel.
“Temos uma na segunda e uma na quinta, com pão, peixe, carne. Às vezes temos degustação de produtos, para as pessoas conhecerem os estabelecimentos vizinhos. Nossa região é boa, mas é longe do centro da cidade e estamos em um bairro muito residencial, então estes eventos trazem comodidade e facilidade, para que os moradores não precisem sair muito de carro”, opina.
Renda extra
Embora as ações não necessariamente sejam focadas em gerar lucros para o condomínio, elas podem incentivar a economia local, apresentando estabelecimentos da região, ajudar na arrecadação e até mesmo trazer outras conquistas para os moradores. É o caso do Residencial Verde Espaço, localizado no Campo Comprido. O grupo de moradores do condomínio é tão conectado e organizado que já se tornou referência de união na região.
Com 24 blocos e 384 apartamentos, o complexo tem cerca de 1300 moradores, muitos dos quais estão por ali há mais de três décadas.
Síndica há sete anos e meio, Wandira Marques presenciou, assim como vários outros vizinhos, a formação de um grupo de amigos que não tem preguiça de colocar a mão na massa quando preciso e que fazem acontecer ações que mobilizam até os prédios vizinhos.
Embora o objetivo seja primordialmente integrar e gerar uma boa convivência, como resultado das iniciativas eles conseguem arrecadar renda extra e realizar mudanças que, não fosse por isso, talvez não fossem possíveis.
“Dentro do condomínio temos o grupo dos voluntários, que são entre 20 e 25, e temos uma conta bancária separada. O que conseguimos juntar com as festas, com a noite do pastel, é investido no condomínio”, comenta a síndica, que complementa explicando que, ainda neste ano, uma nova academia do idoso será instalada com o dinheiro reunido com estes eventos.
A noite do pastel é, inclusive, o mais conhecido dos eventos do Verde Espaço. Uma vez por mês, este grupo de moradores prepara e vende pastéis para os vizinhos de dentro e de fora do condomínio. A data da pastelada é compartilhada via fanpage do Facebook e atrai conhecidos, amigos e ex-moradores. “Isso gera uma convivência muito boa, muito agradável”, conta Gilmar Lançoni, corretor de imóveis que é um dos moradores do Verde Espaço.
“Como voluntários, para nós é uma satisfação e um prazer participar de um grupo que é muito atuante e dinâmico. É uma satisfação ver o evento realizado. Você divulga para todos e isso ajuda a ter uma presença de 70% dos moradores”.
Morador do condomínio há 36 anos, ele viu o começo dessa integração e conta que a comunidade que se formou do lado de dentro da portaria ultrapassou gerações e continuou através delas. “Os nossos filhos cresceram juntos, viraram amigos, agora estão formados, casados e continuaram a amizade. Tem famílias que estão aqui há anos e as pessoas já não se tratam mais apenas como vizinhos que se cumprimentam e termina nisso. Você conhece, confia, sabe quem é aquela pessoa com quem você cruza de manhã e isso faz toda a diferença”.