Criminosos avisavam aos moradores que desejavam ocupar o imóvel e concediam prazo para a saída dos locais
Imagine passar anos aguardando para realizar o sonho da casa própria. Idealizar cada detalhe, projetar uma vida em segurança, construir um legado sob um teto alcançado após muito esforço. Agora suponha que esse desejo antigo seja tomado diante dos seus olhos, sem possibilidade de reação, pelo crime organizado.
Foi o que aconteceu com dezenas de famílias contempladas pelo projeto Minha Casa Minha Vida em Porto Alegre. Moradores da zona sul da capital gaúcha, os proprietários de apartamentos em condomínios do bairro Restinga foram expulsos de casa por uma facção criminosa ligada ao tráfico de drogas. Os espaços antes usados para dar conforto à famílias se transformaram em pontos de extorsão ou de venda de drogas.
O esquema era basicamente o mesmo em todos os casos. Os traficantes avisavam aos moradores que desejavam ocupar o imóvel e concediam prazo para a saída dos locais, sem possibilidade de diálogo. Caso não o fizessem, sofriam agressões e depredação do patrimônio.
Moradores relatam que a compra de botijões de gás deveriam ser realizadas exclusivamente de um ponto clandestino de distribuição montado dentro do condomínio. O espaço destinado ao depósito ilegal era, anteriormente, o lar de uma família. Caminhões de distribuidoras autorizadas estavam proibidos de ingressar no terreno.
Para receberem a correspondência, os moradores tinham de pagar uma espécie de taxa informal, caracterizada como extorsão. Se não repassassem os valores aos criminosos, não tinham acesso às cartas e boletos bancários. Quem não saísse por livre vontade dos apartamentos requisitados pelo tráfico, acabavam sofrendo represálias.
Em virtude de todas essas denúncias a Polícia Civil desarticulou, nesta manhã, a Operação Reintegra. Pelo menos 96 mandados de reintegração de posse foram cumpridos na ocasião, capitaneada pela 16ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre. A partir de agora, uma força-tarefa integrada por outros órgãos públicos tentará reaver os apartamentos conflagrados.
Muitos moradores não pretendem voltar para casa, situações em que será buscada a exclusão de seus cadastros dos programas habitacionais do governo. A delegada Shana Harz ressaltou que outras operações no mesmo sentido foram realizadas anteriormente, mas que é difícil estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Novas ações semelhantes devem ser desencadeadas sistematicamente de agora em diante, mas sem cronograma prévio.