Barulho e rotatividade estão entre s queixas mais recorrentes

Há quem lamente o fim do carnaval. O encerramento da temporada, porém, é um refresco na vida de moradores que perdem a paciência com os aluguéis de curta duração. Desde que essa modalidade começou a crescer no Rio, reclamações por problemas como perturbação do sossego e entra e sai de pessoas estranhas têm marcado reuniões de condomínio.

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— Moro num prédio de 24 apartamentos na Avenida Atlântica, dos quais cinco ficam disponíveis para temporada. Quando chega o verão, a conta de água vai às alturas, assim como a de luz das áreas comuns, por causa desse fluxo. E ainda temos problemas como pessoas falando alto à noite e tocando a campainha de apartamentos errados. O pior é que os proprietários nem tomam conhecimento. Eles ficam só com o bônus, enquanto ficamos com o ônus — desabafa o diretor comercial Marcos Ferreira.

O QUE FAZER?

Ferreira já procurou saber quais providências poderia tomar. Mas, a princípio, entende que pouca coisa pode ser feita, já que não há uma legislação que trate especificamente desses casos.

— Isso é muito complicado, porque hotéis têm toda uma infraestrutura de verificação sobre a origem das pessoas, além de passarem por uma série de fiscalizações. Nos prédios residenciais não temos nada disso, apesar de vários apartamentos terem uma utilização semelhante — comenta ele.

Especialista em direito imobiliário, o advogado Sergio Sender explica que o proprietário tem o direito de usufruir o bem, inclusive locando por temporada, não podendo tal direito ser limitado pela Convenção nem pelo Regimento Interno do Condomínio, sob pena de indevida interferência no direito de propriedade do condômino. Mas há limitações a esse direito na Lei de Condomínios e no Código Civil, em tópicos que exigem a utilização do imóvel de acordo com a destinação do edifício, não podendo usá-lo de forma prejudicial ao sossego, salubridade e segurança.

A lei, segundo Sender, também é omissa no que se refere especificamente ao aluguel de cômodos em apartamentos. Apesar dos impasses, o advogado afirma que, no Rio já existem casos julgados que entendem que, quando caracterizada a exploração da unidade para fins comerciais, o proprietário deve se abster de utilizar o imóvel para tal fim.

Logo, de acordo com ele, o condomínio até pode proibir aluguéis dessa natureza, desde que previsto em sua convenção. A questão, porém, é controvertida, já que também existem decisões que entendem tal veto como afronta ao direito de propriedade.

MULTAS E SANÇÕES

Sender lembra que, antes de partir para a Justiça, a aplicação de sanções em função de infrações cometidas pelos locatários podem surtir efeito, sendo os proprietários os únicos responsáveis.

— O condomínio poderá sempre se valer de multas em caso de perturbação e utilização nociva da propriedade que afrontem os bons costumes da comunidade, desde que estabelecidas na convenção e no regimento interno — diz o advogado.

Persistindo a situação, o condomínio deve recorrer às vias judiciais, inclusive pleiteando uma tutela antecipada de urgência para evitar novas locações.

O advogado Armando Miceli tem acompanhado vários litígios causados pelo conflito entre vizinhos e proprietários que alugam seus apartamentos por temporada. Além da rotatividade de inquilinos, o uso do imóvel para festas está entre as reclamações mais frequentes.

Ele lembra que o dono do imóvel não tem a obrigação legal de comunicar ao síndico ou aos vizinhos que o apartamento está sendo alugado, mas é de bom tom as pessoas saberem que terão estranhos no prédio.

— O proprietário pode alugar seu apartamento por esta via, mas o direito de propriedade não é absoluto. Não pode exacerbar este direito e transformar a vida dos vizinhos em um inferno. Está no Código Civil: “o direito de um acaba quando começa o do outro” — comenta Miceli.

Ele também ressalta que alguns sites que promovem este tipo de locação acabam configurando uma variação que descaracteriza o aluguel por temporada, já que o inquilino pode ficar um ou dois dias. Para o prédio isto é ruim porque gera uma rotatividade muito grande. Ao condomínio, cabe alterar a convenção para proibir este tipo de “turismo”.

— O mundo é dinâmico e as convenções têm que acompanhar isto. Mas digo: não é por ausência de lei que os problemas acontecem, mas por falta de educação, cidadania e civilidade — frisa ele.

Esta observação de Miceli é uma questão central nos questionamentos da moradora de um condomínio na Avenida Ataulfo de Paiva, no Leblon.

— Acho que falta um pouco mais de consciência dos proprietários. Eles deveriam deixar mais claras as regras do condomínio para os hóspedes e acompanhar mais de perto a situação. Tem muita gente que não liga para esses detalhes — lamenta ela, que prefere não se identificar.

A moradora conta que, como boa parte desses turistas vêm para a cidade em clima de festa, é comum não se preocuparem com a vizinhança. Chegam à noite falando alto, largam garrafas de cerveja pelo jardim do prédio e não respeitam as normas de convivência.

— O nosso maior alívio é quando os vemos indo embora com suas malas enormes no fim da temporada. Sabemos que vamos ter um descanso, pelo menos, até o início da próxima — comenta ela.

Pensando nestes problemas, a Rio Spot Homes, que administra cerca de 70 unidades de aluguéis por temporada no Rio, adota uma série de condutas próprias. Parte delas, inclusive, podem ser usadas diretamente pelos proprietários.

— Nosso atendimento funciona 24 horas por dia e sempre temos um responsável para fazer o check-in e o check-out dos hóspedes, independentemente do horário, de prontidão nas portarias — destaca o diretor operacional da empresa, Maurício Garcia. — Além disso, sempre deixamos uma ficha de cadastro dos hóspedes na portaria, com nome completo, identificação, datas de entrada e saída e motivo da viagem.

CONTRATO DETALHADO

Os hóspedes também assinam um contrato com as regras a serem seguidas. São proibidas festas e pernoite de estranhos no apartamento, por exemplo. Além disso, porteiros e síndicos recebem um número de telefone para o qual podem ligar quando quiserem, caso haja problemas. De acordo com Garcia, se cercar destes cuidados tem sido fundamental para garantir a boa convivência.

— Nunca precisamos remover alguém de um apartamento. No máximo, telefonamos pedindo para abaixarem o som ou falarem mais baixo, o que sempre foi atendido — relata ele.