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Fiscalização da gestão condominial

Justiça nega indenização e assegura direito de moradora de fiscalizar síndica

 

A 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais de Goiás reformou, recentemente, uma sentença que havia condenado uma moradora de um condomínio a pagar indenização por danos morais à síndica local. A decisão trouxe à tona a importância do direito à fiscalização e à liberdade de expressão no contexto condominial. A moradora, representada pelo advogado Fernando Barcelos, questionava a administração do condomínio, mas a Justiça entendeu que seus atos não configuravam qualquer ofensa pessoal à síndica.

De acordo com o processo, a síndica alegava que os questionamentos da condômina ultrapassavam os limites legais e que configuravam abuso de direito, resultando em ofensas à sua honra. No entanto, ao analisar o caso, a relatora, juíza Ana Paula de Lima Castro, destacou que não se verificou nos autos qualquer injúria ou difamação dirigida à pessoa física da administradora. Para que se configure o dano moral, é necessário que haja ofensa direta à honra ou imagem, o que não ocorreu.

Direito de fiscalização garantido por lei

O cerne da questão gira em torno do equilíbrio entre a liberdade de expressão e os direitos de personalidade no âmbito condominial. O Código Civil, em seu artigo 1.348, inciso VIII, garante aos condôminos o direito de fiscalizar a administração do síndico. Esse dispositivo estabelece que cabe ao síndico prestar contas claras e transparentes sobre sua gestão. A juíza relatora enfatizou que, dentro desses limites, críticas e questionamentos relacionados à gestão são instrumentos legítimos para assegurar a boa governança do condomínio.

Além disso, a Constituição Federal reforça a liberdade de manifestação do pensamento e de opiniões, desde que observados os parâmetros da razoabilidade e do respeito mútuo. “As críticas encontram amparo no direito de fiscalização dos condôminos e no dever de transparência da administração condominial. Não configurando qualquer ilicitude ou comportamento difamatório, mas refletindo, em essência, um exercício legítimo de acompanhamento e zelo pela boa governança do ambiente residencial”, ressaltou Ana Paula de Lima Castro em seu voto.

O direito de fiscalização tem como objetivo promover transparência e qualidade na administração condominial, assegurando que os interesses coletivos sejam respeitados. No caso analisado, as críticas da moradora visavam unicamente a administração do condomínio, e não a honra pessoal da síndica. Para os magistrados da 3ª Turma, essa distinção é importante para evitar que atos legítimos de fiscalização sejam tratados como perseguição ou assédio.

A decisão destacou ainda que a atividade de síndico, por ter caráter quase público dentro da comunidade condominial, está naturalmente sujeita a questionamentos e críticas.

Quando a crítica não configura dano moral?

Para que críticas sejam consideradas excessivas e gerem passivos como danos morais, elas precisam extrapolar os limites da legalidade. Isso ocorre, por exemplo, quando há difamação, injúria ou qualquer tipo de ataque direto à honra pessoal de uma figura pública ou particular. Na situação em questão, não houve qualquer evidência de que a moradora tivesse a intenção de desmoralizar a síndica perante os outros condôminos ou em ambientes públicos.

Princípios constitucionais norteiam decisão

Outro aspecto relevante é que a decisão baseou-se nos princípios constitucionais da liberdade de expressão. A Constituição Federal protege a manifestação do pensamento (art. 5º, IV) e assegura o direito de crítica, desde que não ultrapasse os limites legais. Essa proteção é fundamental para que o cidadão exerça o controle social sobre administrações, sejam elas públicas ou privadas, como é o caso dos condomínios.

Conforme ressaltou a juíza relatora, é imprescindível equilibrar a liberdade de expressão com o princípio da dignidade humana, que protege a honra e a imagem das pessoas. Esse equilíbrio evita que críticas legítimas sejam vistas como ofensas e, ao mesmo tempo, impede abusos que possam violar direitos de personalidade.