Região central da capital paulista tem 87 mil domicílios não-ocupados e uma área equivalente a 2,51 milhões de metros quadrados de terrenos vazios

O uso habitacional do Centro de São Paulo poderia contribuir para o enfrentamento à crise climática e melhoria da qualidade de vida da população. Considerando o padrão de deslocamento das pessoas em um período de vinte anos (2002 a 2022) e a construção de moradias nos terrenos vazios da região central, reformas ou reabilitação de imóveis não ocupados, 4,4 milhões de toneladas de gás carbônico deixariam de ser despejadas na atmosfera, o equivalente a 1% do total de emissões do Brasil em 2022. A estimativa foi apurada pelos pesquisadores do Instituto Pólis e divulgada na última semana em estudo inédito. Os dados completos do estudo estão disponíveis no site do Pólis.

De acordo com o levantamento, uma pessoa em condição de baixa renda da periferia que passasse a morar no Centro poderia usufruir de até 3 anos de vida a mais em outros tipos de atividades (como educação, lazer, convívio familiar) – equivalente à economia de 2 horas e 35 minutos por dia gastos em deslocamentos pela cidade.

A partir de dados do Censo 2022, o Instituto Pólis identificou a existência de 87.427 domicílios não-ocupados: são imóveis já edificados na área central. Ao mesmo tempo, na mesma região há ainda 3.408 terrenos vazios, que somam 2,5 milhões de metros quadrados. Aproveitando o potencial destes terrenos, seria possível construir 114.876 novos domicílios na região central. Ao todo, somando o potencial habitacional dos domicílios já construídos e dos terrenos vazios, o Centro da capital paulista poderia abrigar, aproximadamente, 202 mil famílias.

São Paulo possui um padrão de urbanização altamente espraiado e excludente, que empurra a população de menor renda para os extremos da cidade. Além das grandes distâncias, a expansão urbana observada nos últimos 20 anos foi altamente predatória ao meio ambiente e resultou na supressão de mata nativa para abertura de novos loteamentos e moradias, incentivando a instalação de infraestruturas urbanas precárias, poluição de mananciais, entre outros problemas.

“Usar os imóveis vazios do centro para abrigar a população de baixa renda é uma medida de justiça climática. Ao mesmo tempo que reduz a emissão de Gases do Efeito Estufa, a medida protege famílias que estão em risco e cumpre com a Função Social da Propriedade, princípio da Constituição Federal” aponta o urbanista Rodrigo Iacovini, coordenador da pesquisa e diretor do Instituto Pólis.

Redução do transporte

Os dados mostram que 64% do total de emissões de gases de efeito estufa da cidade de São Paulo são provenientes do transporte (de carga e passageiros). A população de áreas periféricas e de baixa renda é a que mais sofre com as longas distâncias percorridas diariamente para chegar ao trabalho, escolas, universidades. Se os 202 mil domicílios potenciais do Centro fossem ocupados por estas famílias, haveria uma economia potencial de:

1,25 milhões de quilômetros de carro rodados todos os dias úteis, que equivalem a 31 voltas ao mundo;
557 mil quilômetros de moto rodados todos os dias úteis, que equivalem a 14 voltas ao mundo.
A crise urbana e habitacional que gera o quadro atual de imóveis ociosos na área central de São Paulo representa um custo significativo para as emissões de gases de efeito estufa. Reverter a ociosidade do Centro, portanto, traria impactos ambientais positivos, reduzindo em 4,4 toneladas a emissão de gases do efeito estufa, o equivalente a 56% da emissão anual de um país como o Uruguai. Para mitigar essa emissão seria necessário, por exemplo, o plantio de 36.618 campos de futebol de Mata Atlântica.

Por outro lado, as vantagens de abrigar a população de baixa renda no centro iriam além da mitigação e da própria melhoria das suas condições de vida: economizaria bilhões de reais em futuros processos de adaptação climática das áreas da cidade que hoje habitam e salvaria milhares de vida, as quais estão hoje em risco diante de eventos climáticos extremos.