Como apenas uma pessoa pode decidir a eleição de síndico
Cleuzany Lott (*)
Síndicos ou subsíndicos que permanecem no cargo por longos períodos e candidatos que concorrem à vaga com a certeza da vitória. Isso é possível graças ao uso amplo das procurações para o voto em assembleias condominiais. Contudo, a estratégia por trás disso pode enfrentar obstáculos.
Nos primeiros meses do ano, especialmente em março, as eleições de síndicos ocorrem em todo o país. As articulações começam antes mesmo do edital ser divulgado. Enquanto alguns candidatos investem no contato direto com os condôminos, outros buscam obter procurações dos proprietários que não residem no prédio.
Essa prática tem sido bem-sucedida. De acordo com dados do IBGE, em 2022, cerca de 20% da população brasileira vivia em domicílios alugados e 8,8% em domicílios cedidos. Como nem sempre os residentes participam ativamente das atividades condominiais, a quantidade de procurações frequentemente ultrapassa o número de presentes nas assembleias de eleição de síndico.
O Código Civil estabelece as diretrizes para as procurações, conferindo poderes de representação. O artigo 653 define o mandato como a transferência de poderes para agir em nome de outrem, sendo a procuração o instrumento desse mandato.
O artigo 1.289 complementa, indicando que qualquer pessoa maior de idade ou emancipada, com plena capacidade civil, pode outorgar uma procuração por meio de instrumento particular, desde que contenha sua assinatura. O mesmo se aplica ao procurador nomeado.
Não há limitações legais quanto ao número de procurações que uma pessoa pode receber. Portanto, no âmbito do direito privado, o que não é expressamente proibido é permitido. Isso significa que um candidato pode angariar quantas procurações conseguir e votar em si mesmo, aumentando suas chances de eleição.
Exemplificando: em um condomínio composto por apenas dez unidades, se um candidato consegue obter cinco procurações, ele automaticamente se posiciona em vantagem significativa. Com o seu próprio voto aliado às cinco procurações, ele assegura a vitória, deixando o outro concorrente sem chances de competir.
A esperança dos demais candidatos estará na ausência de algum requisito legal da procuração, que é bem simples: deverá conter a designação do Estado, cidade ou circunscrição civil, data, nome do outorgante e outorgado, objetivo da outorga, natureza, designação e extensão dos poderes conferidos.
Esse documento pode ser redigido à mão ou impresso, sem a necessidade de registro em cartório ou autenticação de assinatura, a menos que exigido pela convenção condominial.
Democracia x abuso
Os condôminos que discordam dessa prática argumentam que a concentração de procurações é um abuso de direito e alegam que o processo seria mais democrático com a participação direta dos residentes. Mas procuração é um documento legal e não pode ser contestado ou proibido. Contudo, é permitido estabelecer restrições.
Algumas convenções condominiais incluem critérios como a proibição do uso em interesse próprio, a limitação da quantidade de procurações por pessoa e a vedação da representação por parte do síndico, entre outros. No caso de a convenção não prever restrições, uma assembleia geral convocada para esse fim pode supri-las.
É importante reconhecer que a legislação permite mudanças, mas a implementação depende de ação para se tornar realidade.