Acolhimento e exceções em regras condominiais beneficiam pessoas com espectro autista
O assunto inclusão perpassa várias áreas da sociedade, entre elas o convívio em ambientes como os condomínios, realidade de cerca de 40% da população brasileira. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 70 milhões de pessoas no mundo e 2 milhões no Brasil tenham autismo, assim, as chances de já ter convivido com alguém com transtorno do espectro autista são altas.
No entanto, mesmo sendo algo comum de se encontrar, especialistas afirmam que uma série de reclamações são recebidas em assembleias condominiais tratando pessoas autistas como um problema dentro do condomínio.
O advogado especialista em direito condominial, Cezar Nantes, conta que já é um entendimento pacificado na justiça brasileira de que os condomínios que devem se adaptar a pessoa com deficiência e não o contrário, incluindo as pessoas autistas.
“A pessoa com deficiência necessita de tratamento diferenciado e cuidados especiais, mas principalmente do acolhimento de toda coletividade. O ideal, então, é que a unidade que tenha uma pessoa com autismo deixe ciente sobre a condição, pelo menos, aos moradores mais próximos e a gestão”, explica.
A proteção da pessoa com autismo é interesse público, por isso, os condomínios não estão autorizados a aplicar reclamações e penalidades, como multas e advertências, bem como falar em perturbação do sossego. Além disso, o preconceito com moradores que possuam tal deficiência também deve ser combatido.
“A lei do autista se sobressai à lei do silêncio, já que não é um comportamento provocado intencionalmente. Existem graus de autismo e algumas pessoas acabam tendo crises, emitindo sons e barulhos. O condomínio não pode advertir, não pode multar e nem pode caracterizar aquele condômino como antissocial. É importante entender que todo tipo de penalidade dentro do ambiente condominial tem um caráter educativo, e já que essa é uma situação que não se tem controle, não tem como aplicar uma advertência educativa. Assim, os condôminos precisam entender que isso é uma situação cotidiana”, destaca o advogado.
É papel do síndico procurar orientar, educar, incluir, sensibilizar e não permitir ou ser coniventes com preconceitos. Para isso, o condomínio pode promover reuniões, conversas, palestras e workshops que realmente possam amparar e acolher esses moradores e suas famílias. Se mesmo sabendo do diagnóstico os vizinhos continuam reclamando, essa atitude pode configurar crime de perseguição.
Casos específicos que possam representar riscos aos demais moradores ou patrimônio podem e devem ser tratados de forma individual com toda parcimônia e respeito. Aqui também é válido que os porteiros tenham conhecimento sobre o comportamento autista, saber socorrer, agir com discrição, bem como explicar delicadamente a situação ao responder a queixa do vizinho, já que eles serão os primeiros acionados em caso de reclamação.
“O síndico vai ser a ponte que irá intermediar as situações de casos específicos. Por exemplo, é muito comum que crianças autistas atirem objetos pelas janelas que podem causar algum acidente ou prejuízo financeiro. O síndico poderá orientar sobre a colocação de telas e como os responsáveis podem arcar com o prejuízo. O condomínio não vai poder punir, mas o pai ou responsável precisar arcar e ver como ele pode evitar qualquer tipo de transtorno à coletividade”, ressalta.
O advogado Cezar Nantes também esclarece que em alguns casos levados até os tribunais, os juízes pediram para o condomínio se adequar ao autista, mas também exigem que os pais e responsáveis pela pessoa com TEA as levem para terem tratamento adequado que possa melhorar a qualidade de vida dele, da família e também da coletividade, já que com tratamentos específicos e mais modernos as crises podem diminuir.
“Essas pessoas precisam ser abraçadas pelo condomínio, até porque os vizinhos vão escutar os barulhos feitos pelo autista e podem achar que a criança esteja sendo agredida. Inclusive porque há em Alagoas uma lei estadual que obriga que o síndico reporte e denuncie casos de violência doméstica a autoridades policiais. Então, o primeiro passo é de que os condôminos saibam da condição daquela criança autista para que haja um entendimento”, finaliza o advogado condominial.