Ministério Público aponta que dano ambiental causado pelo condomínio de luxo culmina em alagamentos na Barra do Sahy, em São Sebastião
Com um nome alusivo à proteção ambiental, o condomínio de luxo Reserva da Mata é acusado pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) de desmatar, prejudicar rios e a drenagem da Barra do Sahy, em São Sebastião, no litoral norte paulista.
A região foi a mais castigada pelos deslizamentos de terra causados pelo temporal durante o Carnaval, que resultaram em 65 mortes e deixaram mais de 4 mil pessoas sem moradia. A tragédia ocorreu na Vila do Sahy, que fica do lado oposto da rodovia, e não no trecho da praia, a Barra do Sahy, onde fica o condomínio. Ou seja, a região toda tem um grande problema ambiental.
Segundo o MPSP, a degradação ambiental provocada pelo empreendimento residencial é apontada como causa para alagamentos de casas e comércios na região quando chove.
Em um terreno de 21.450m², em uma das margens do Rio Sahy, o empreendimento reúne 30 mansões, quadra poliesportiva, salão de festa e academia. Cada imóvel de luxo na Avenida Adelino Tavares tem 210m², quatro suítes, piscina privativa, churrasqueira e forno a lenha.
Em 2012, já existiam autos de infração sobre a construção do condomínio. Posteriormente, a polícia instaurou um inquérito civil para investigar a obra.
O condomínio chegou a ser embargado, mas a restrição caiu após uma decisão do Tribunal de Justiça. Atualmente, casas no endereço estão anunciadas na internet por valores que vão de R$ 3 milhões a R$ 4,7 milhões.
Em 2020, o promotor Alfredo Luis Portes Neto afirmou que a implantação do empreendimento, assim como as aprovações municipais, “se deram de forma ilegal”, por causa da “inexistência de aprovação do Residencial Reserva da Mata pelos órgãos públicos estaduais competentes”.
Por estar em área tombada e de manguezal, afirma a Promotoria, o condomínio deveria ter tido aprovação do Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais (Graprohab), da Companhia Ambiental de São Paulo (Cetesb) e do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat). Outras irregularidades apontadas pelo MP foram a canalização e o desvio do curso do rio sem autorização legal.
Em 2015, a Associação Amigos da Barra do Sahy ajuizou uma ação civil pública também apontando irregularidades na implementação do empreendimento. O processo foi adicionado ao que já estava em curso no MPSP. Nessa sexta-feira (3/3), a organização protocolou uma nova petição sobre o caso.
“Existem dois córregos que atravessam o espaço do Reserva da Mata, eles saem da área de sertão e cruzam a estrada que leva para a Barra do Sahy. Ilustrando grosseiramente, para otimizar espaço de construção de casas, o condomínio canalizou esses dois córregos. Até parece irônico, o Reserva da Mata não tem uma árvore. Parece um centro penitenciário, uma coisa horrorosa”, diz Fernando Castelo Branco, advogado e diretor da associação.
A construção do condomínio é apontada também como a causa dos alagamentos em ruas, casas e comércios na região quando chove muito. “Não só infringiram com essa canalização irregular dos córregos como também avançaram em uma área de mangue, que é uma área de proteção permanente. Isso está causando um alagamento na Barra do Sahy e vira um caos, a água fica parada e aumentam as doenças contagiosas”, afirma o advogado.
Segundo o representante da associação, o acúmulo de água também prejudica a Escola Municipal Henrique Tavares de Jesus, que recebeu doações e acolheu pessoas desabrigadas pelos deslizamentos que ocorreram em São Sebastião durante o Carnaval. Mais inundações na região foram registradas ao longo da última semana, quando voltou a chover forte na região.
Prefeitura
Em resposta ao Metrópoles, a Prefeitura de São Sebastião afirma que aprovou a construção do empreendimento desde que fossem respeitados os limites de preservação ambiental. A gestão municipal afirma neste mandato e no anterior não foi conivente com a irregularidade cometida pela incorporadora na Barra do Sahy.
“Somente em 2020, o Ministério Público (MP) moveu Ação Civil Pública Ambiental contra a incorporadora, alegando degradação de APP. Segundo a Promotoria, contrariando o que havia autorizado sete anos antes o Poder Executivo, a AGX avançou os limites geográficos do terreno e construiu em cima de um mangue, que ficou totalmente destruído, e de um curso d’água”, diz a prefeitura em nota.
Construtora e incorporadora
A reportagem do Metrópoles procurou aa C2J Construtora e Desenvolvimento Urbano e a A.G.X. Incorporadora Barra do Sahy, mas nenhuma das partes mencionadas na ação civil pública do MPSP retornaram o contato. O espaço segue aberto para manifestação.
A A.G.X. Incorporadora alegou que o assunto já foi tratado em dois Termos de Recuperação Ambiental e a C2J Construtora afirmou que o imóvel não está em área de preservação permanente.
A empreiteira também afirmou que tem autorização do Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee) para interferir no afluente do Rio Sahy, que a área envolvida nos autos de infração ambiental já foi recuperada e que não há provas de danos intercorrentes ou danos morais coletivos.
“A continuidade das obras, com o prolongamento da tubulação, foi autorizada pela Defesa Civil, uma vez que fortes chuvas afetaram a região e provocaram alagamento no bairro e despejo de esgoto na casa dos moradores, de modo que a intervenção foi realizada em caráter de urgência, nos termos do art. 8º, §3º, do Código Florestal de 2012”, afirmou a defesa da C2J.
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