O acerto individual entre o governo e ocupantes de lotes em condomínios, anunciado pela Terracap para a Etapa 2 do Jardim Botânico, poderá ser feito em outras áreas - até em terras da União
O acordo fechado na última quarta-feira pelo GDF com moradores de condomínios da Etapa 2 do Jardim Botânico servirá de modelo para acelerar a regularização de outros parcelamentos em terras públicas.
A Agência de Desenvolvimento de Brasília (Terracap) achou uma brecha na legislação para lançar o edital de venda direta mesmo com a existência de uma liminar que proíbe a comercialização de terrenos da área.
A saída encontrada pela empresa foi negociar individualmente com cada ocupante e vender os lotes a quem estiver interessado em legalizar o lote. Quem não quiser aderir à venda direta, entretanto, não sofrerá sanções e poderá aguardar o desfecho de ações judiciais.
A Secretaria de Patrimônio da União (SPU) informou que também poderá usar esse mecanismo na regularização de terras do governo federal que estiverem em litígio.
“A conciliação é uma tendência do Judiciário e uma realidade hoje na Terracap”, justifica o presidente da companhia, Júlio César Reis.
A expectativa do governo é conseguir a adesão de cerca de 90% dos moradores dos seis condomínios da região. A negociação será fechada com base no Artigo 16 da Lei Federal 13.645/17.
O texto estabelece que “as áreas de propriedade do poder público registradas, que sejam objeto de ação judicial versando sobre a titularidade, poderão ser objeto de Reurb (programa de regularização), desde que celebrado acordo judicial ou extrajudicial, homologado pelo juiz”.
O acerto entre a Terracap e a comunidade do Jardim Botânico deverá ter ainda a chancela do desembargador Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região.
No último dia 9, ele concedeu a liminar que paralisou a legalização para a realização de uma perícia nas terras dos parcelamentos.
Fazem parte da região os condomínios Jardim Botânico I, Jardim Botânico VI, Mirante das Paineiras, Parque e Jardim das Paineiras, Estância Jardim Botânico I e Estância Jardim Botânico II. Ao todo, a área tem 1,2 mil terrenos residenciais.
Segundo a Secretaria de Patrimônio da União, a regulamentação da Lei 13.465/17, conhecida como Lei da Regularização, está em fase de conclusão.
O governo federal vai detalhar o alcance de vários dispositivos, entre eles o Artigo 16. “Portanto, esse é um mecanismo que poderá ser utilizado pela União na regularização fundiária”, informou, em nota, a SPU.
Síndico de um condomínio na Chácara 78 da Colônia Agrícola Samambaia, em Vicente Pires, Dimas Mendes está otimista com os avanços da regularização. Ele é a favor da venda direta, “desde que o governo fixe um preço justo”.
Mas ele reconhece que uma minoria do bairro não quer pagar de novo pelos terrenos e pretende brigar por tempo indeterminado na Justiça.
“Com esses acordos, o processo não ficará paralisado e, quem tiver interesse poderá comprar os terrenos e receber finalmente a escritura”, comenta Dimas.
Na região, que é de propriedade da Terracap, pelo menos 90% dos 4,1 mil moradores já se cadastraram para participar da venda direta.
Para os moradores, a preocupação está no valor que será cobrado pela Terracap — os preços só serão divulgados no lançamento do edital, previsto para um prazo de 15 dias.
O servidor público Pasquale Matafora, 60 anos, é síndico e morador do condomínio Jardim Botânico I, um dos locais que serão contemplado pela venda direta. De acordo com ele, a regularização é um anseio de quem vive na área, no entanto, o GDF deve realizar o processo “com foco na população”.
“O governo abriu um diálogo direto com a gente. Agora, é preciso respeitar a capacidade da população de arcar com o pagamento. Queremos resolver logo essa situação, mas não descartamos a possibilidade de sermos indenizados no futuro caso a medida seja derrubada”, afirma.
Para Matafora, a expectativa dos moradores está no edital de preços. Mesmo com o acordo firmado, o síndico ainda considera o pagamento como ilegítimo. Ele conta que os lotes comprados eram de terras particulares.
“Ninguém se aventurou em comprar lotes de grileiros. Nós investimos economias de uma vida inteira no setor. Quando cheguei aqui, há 17 anos, só tinha barro. Transformamos esse ponto do Jardim Botânico em um lugar de classe média alta com nosso próprio investimento”, diz.
Matafora alega que o governo não pode aplicar um valor igual ao que foi implementado em outras áreas irregulares.
Além disso, ele relata que o preço de mercado não deve ser o utilizado pela Terracap, e sim um valor social que não comprometa a renda das pessoas.
De acordo com Pasquale, o receio é de que os moradores comecem a vender as próprias casas para conseguir dar conta de pagar as prestações.