Síndicos mostram situações que geram desgaste emocional e apontam soluções para reduzir o problema
A pressão do trabalho gera estresse e está em todas as atividades profissionais, e com os síndicos não é diferente. Um atenuante na questão é lidar com os imprevistos a qualquer hora do dia e da noite e até mesmo nos fins de semana: a bomba d’água que não funciona, o portão do edifício que está com defeito, o elevador parado, vazamento de gás, temporais que destelham o prédio...
São muitas as situações que devem ser resolvidas com urgência e se somadas a tantas outras que envolvem a administração diária de um condomínio podem trazer estresse e um grande desgaste emocional aos síndicosMas como evitar isso? Para a coach Vanessa Tobias que, aliás,também já foi síndica,o segredo é se policiar para manter a cabeça e as emoções sempre em dia. “As nossas emoções determinam todas as nossas ações, como síndico ou em qualquer outra função. Então, a rotina leve e prazerosa depende de ter a nossa estrutura íntima bem localizada”.
É claro que os problemas existem, assim como em qualquer cargo. Vanessa, no entanto, ressalta que é possível enxergá-los de uma forma menos incômoda. “É preciso entender que alguns problemas fazem parte do trabalho, e que essa função que nós recebemos, de ‘resolvedor’ de problemas, de alguém que coloca as coisas em ordem, é porque nós temos a competência e o talento para isso”, observa.
Para Karim Bacha, que é psicólogo há 30 anos e já atuou na área de Educação Especial, Psicologia Educacional e como professor de Psicologia, outro ponto importante é simplesmente ter paixão pelo que se faz. “Considero que, para conciliar a profissão de psicólogo e a de síndico com a sensação de fazê-los com leveza e prazer, tem a ver com gostar do que faço”, diz ele, que também mora na capital catarinense e é síndico do Condomínio Edifício Aplub Visconde. “É uma questão íntima de decisão de ser feliz no trabalho e de ter a mente tranquila”, completa Vanessa.
A visão do que é ser síndico mudou bastante depois que Karim assumiu a função. Segundo o psicólogo, as pessoas ainda tendem a fazer críticas descontextualizadas por não terem conhecimento sobre a origem ou complexidade dos diversos problemas que um edifício pode apresentar.
“(As pessoas) querem ver os problemas solucionados. Não se preocupam em como resolver, além de serem muito ‘econômicas’ no que se refere a reconhecer um trabalho bem feito, a estimular o síndico em seu trabalho. Um elogio, vez por outra estimula, embora não deva ser o objetivo, é claro”, comenta.
Para ele, os principais desafios do cargo são de ordem técnica: “são problemas hidráulicos, elétricos, administrativos, incluindo a legislação, administração de pessoal, entre outros, e o desafio está em manter tudo funcionando, com conforto, segurança e transparência, pois é um cargo de confiança. O síndico é eleito e, portanto, precisa representar dignamente suas funções”. Karim afirma que, se cercar de pessoas e empresas idôneas o ajudam a desenvolver a função com mais tranquilidade.
Buscar o autodesenvolvimento, com recursos como livros, vídeos e conversas com outros síndicos também contribui, segundo Vanessa. “A ajuda externa facilita porque quem está dentro do problema tem mais dificuldade em saber como resolvê-lo”, observa.
“Resolver um problema sempre tem relação com a nossa intenção em resolvê-lo, em tirar o foco do problema e focar na solução”, continua.
Como os síndicos administram tantas responsabilidades e o que fazem para driblar os problemas do dia a dia?
Recém-empossado em sua terceira gestão, o síndico Mário Nicolau Gomes, que administra o Residencial Boulevard Nair Vieira, em Campinas, São José, tem pela frente uma tarefa que já está lhe preocupando: administrar a relação com o grupo de conselheiros. “Como são 11 membros, será difícil manter uma unanimidade nas questões ligadas ao condomínio. Afinal, cada um pensa de uma maneira, cada um tem uma proposta ou uma ideia diferente. Minha expectativa é preservar um bom relacionamento para discutir prioridades e sugestões para o bem comum”, diz Mário, que se prepara para a primeira reunião com o Conselho nos próximos dias.
Para evitar desgastes na profissão, já que comanda um condomínio misto de quatro blocos com 351 apartamentos e 57 lojas comerciais, Mário mantém uma filosofia de vida que o acompanha desde a juventude: “Eu parto do seguinte princípio: deve-se fazer só aquilo que se gosta e que nos dá prazer”, ensina, lembrando também de outra receita infalível: “Não abro mão de tirar meu sono de quinze minutos depois do almoço. Assim, recarrego as baterias para enfrentar o resto do dia”.
Já a síndica Sandra de Sousa Alves costuma se incomodar com as faltas ao trabalho dos funcionários. Responsável pelo condomínio Montreal, localizado na Rua Felipe Schmidt, centro de Florianópolis, ela, volta e meia, troca as suas tarefas para exercer a de um colaborador. “Hoje, por exemplo, o porteiro diurno não veio trabalhar. E eu vou ter de fazer o serviço dele que é entregar as cartas, abrir as portas, entre outros”, diz Sandra que, diante dos problemas, decidiu contratar uma Portaria Remota para substituir o porteiro. “Vamos ficar com dois funcionários - um zelador e uma faxineira”, explica.
Síndica profissional, Sandra administra o residencial com 49 apartamentos e duas salas comerciais. Para reduzir o estresse do trabalho, seu passatempo preferido é caminhar na Avenida Beira-Mar. “Também não costumo levar as dificuldades para casa, e, desse modo, consigo desligar. Se não der para resolver o problema naquele dia, fecho a porta, vou para casa e no outro dia tento resolver”, ensina.
A mediação de conflitos é considerada a situação mais desgastante na rotina do síndico Rogério Freitas. Há seis anos atuando como síndico profissional, Rogério administra hoje cinco condomínios, que somam 156 unidades de apartamentos, além de sete salas comerciais.
“Sempre há um prejuízo nessa relação, por isso a atividade de síndico profissional está em crescimento”, afirma, ao citar um exemplo: “recentemente o veículo de um condômino foi atingido pelo portão automático e o conselho deliberou que a culpa foi do morador que não administrou corretamente o tempo de programação do portão, mas como o portão possui sensor de antiesmagamento, o condômino entende que a responsabilidade do condomínio é objetiva e deve arcar com o prejuízo.
Como para poder movimentar a conta do condomínio é necessário duas assinaturas, a subsíndica que assina comigo só o fará mediante autorização do conselho, que negou o pleito do condômino.
O condômino já intercedeu pessoalmente aos conselheiros, onde houve um desgaste, com contatos feitos em horários inadequados como no domingo de noite”.
Adepto da Inteligência Emocional, Rogério diz que para amenizar o desgaste da função é preciso desenvolver algumas habilidades, como a postura e disciplina para tratar de assuntos que não são urgentes e emergências em horários comerciais. “Desde 1998 o mundo corporativo, após o surgimento da obra “Inteligência Emocional” de Daniel Goleman, começou a valorizar os profissionais que dominam suas emoções mais do que os que possuem um alto QI.
Cada vez mais é senso comum que o condomínio é ou deve ser administrado como uma empresa, sendo assim é necessário voltar o olhar para o mundo corporativo e modelar as habilidades dos executivos de sucesso das grandes empresas e trazê-las para o cotidiano dos síndicos”.
Síndico do Condomínio Bosque das Estações, no bairro Bela Vista, na Palhoça, o Pandolfo Bonapaz é outro profissional que atribui como questões mais estressantes os conflitos internos. Para ele, a parte administrativa não tem mistério, pois faz parte de sua formação. A grande dificuldade é mesmo intermediar os conflitos. “Muitos não entendem as normas do Regimento Interno, o que acaba gerando um pico de estresse desnecessário tanto para o síndico como para o condomínio. Se todos tivessem conhecimento das regras e cumprissem as normas, teríamos uma melhor convivência”, desabafa.
Ao todo, o condomínio reúne 384 apartamentos residenciais e seis lojas comerciais. “São 1.800 pessoas convivendo no mesmo local. Então, é muita gente, chega a ser uma minicidade”, diz Leandro, admitindo que a função do síndico é ser de tudo um pouco.“Um pouco psicólogo, um pouco médico, um pouco conselheiro, um pouco amigo”.
Há três anos no comando do residencial, ele dá uma boa dica para continuar exercendo a profissão: aproveitar os finais de semana e feriados para sair do condomínio. Visitar a família, ir para um sítio, visitar outros condomínios, conversar com outros síndicos. Além da procura do conhecimento em palestras e cursos. “Tudo isso ajuda a buscar forças para equilibrar o bem-estar de todos”, completa.
BOX
Aprender a administrar o tempo auxilia o síndico a exercer o trabalho
O planejamento e a organização de rotinas são as principais ferramentas para uma boa gestão e evitam desgastes emocionais desnecessários:
- Estabeleça metas e cronogramas, assim poderá alcançar seus objetivos com maior eficiência e racionalização de esforços. Quem administra adequadamente o tempo sente que consegue fazer tudo o que planeja, do contrário as atividades fogem do controle;
- Mas evite excessos, pois não adianta programar mil tarefas e conseguir executar apenas metade, você irá se sentir frustrado. Na dúvida sobre o que é mais ou menos prioritário pare e questione-se: quais serão as consequências se eu não fizer isso primeiro?
- Problemas pequenos ou grandes devem ser encarados de forma efetiva até sua solução, pois, do contrário, poderão transformar-se em questões mais amplas. Por exemplo, se um equipamento está apresentando problemas, a orientação é que se resolva de imediato sem deixar que estrague de vez para então tomar providências;
- Um síndico de primeira viagem pode se deparar com uma situação no condomínio que o leve a adiar a execução da tarefa, cometendo o erro da procrastinação. É preciso saber executar as ações importantes, pois o síndico não pode ficar só “apagando incêndios”;
- Mantenha um cadastro de fornecedores, prestadores de serviço e dos próprios moradores, pois isso permite contato rápido em situações de emergência ou mesmo nas necessidades do dia a dia;
- Quando o síndico mantém o controle das manutenções preventivas e revisão dos equipamentos, os riscos de emergências são minimizados. Além disso, a manutenção periódica evita gastos maiores que acabam por causar insatisfação dos condôminos que terão de arcar com valores inesperados;
- Organize as rotinas de manutenções preventivas: o síndico deve ter em mente que é de sua responsabilidade manter todas as instalações do condomínio em funcionamento, afinal, ele será o primeiro a ser cobrado no caso de um eventual problema.